domingo, 17 de agosto de 2014

Arena Corinthians

A questão do Estádio
Ninguém há de discordar que a efetivação do antigo projeto, tantas vezes postergado, da construção do estádio corinthiano é um ganho e tanto. É como um sonho realizado. Mas isso não quer dizer que não mereça críticas ou reparos.
Primeiro, eu penso  que a construção do estádio em Itaquera é correta e remonta o final dos anos 70 quando o Corinthians recebeu o terreno na contrapartida, ainda, da perda de parte significativa da área do Parque São Jorge quando da construção da Marginal Tietê. Construir em Itaquera requereria o entendimento do perfil da região o que, parece, não foi levado em consideração no momento do planejamento. Construiu-se um estádio com características espaciais que projetam a presença de um público, na sua maioria, não morador das regiões do entorno do estádio. Para esse  público que se quer, haveria que se pensar em uma logística de transporte que contrapusesse a desestimulantes distância do estádio. Mais do que isso, mesmo esse público de maior poder aquisitivo, ele só pagará mais caro pelo ingresso de forma sistemática, se houver uma contrapartida, ou seja, que o time tenha sempre jogadores estrelares ou que esteja sempre disputando títulos. Essa é uma mudança de perfil de público que altera em muito a relação do Corinthians com a sua torcida tradicional. Não levar essa, mais do que significativa mudança em conta, demonstra que o planejamento teve arestas que, premeditadamente ou não, não foram preenchidas.

NÃO É VERDADE ABSOLUTA QUE A ELITIZAÇÃO DO PÚBLICO TRAGA RETORNOS FINANCEIROS GARANTIDOS
A Arena Corinthians tem, supostamente, uma capacidade de 48 mil lugares( digo “supostamente” porque parece ser menor, vide a capacidade disponibilizada para a Copa, de 62 e não 68 mil lugares mesmo com o aumento provisório de 20 mil lugares), portanto, seriam quase 10 mil a mais do que o Pacaembu. Ainda assim, diminuiu-se o espaço para a camada mais popular.  Temos aqui, claramente, um contrassenso.  No Pacaembu, região central e abastada, o Corinthians tinha uma média de 28 mil pessoas por jogo mas, corriqueiramente, as cadeiras azuis, numeradas, descobertas e, sobretudo as cobertas, ficavam invariavelmente com baixa taxa de ocupação. O que leva a diretoria atual a acreditar que, passada a curiosidade inicial, que os setores leste e oeste do estádio, mais caros do que eram no Pacaembu, fiquem cheios? Poderíamos entender talvez que os preços altos neste momento são, de fato, uma oportunidade de negócio, estimulado pelo momento de novidade que o estádio proporciona, mas, mesmo assim, o setor oeste tem ficado com pouca ocupação. Contudo, ocorre que, mesmo que tenhamos este entendimento, a concepção da arena está posta, e ela privilegia, na sua espacialidade, a elitização do público. Talvez essa concepção tivesse sucesso em uma região central da cidade, com maior poder aquisitivo. Um estádio moderno, mais confortável que o Pacaembu, traria provavelmente um público não costumeiramente freqüentador de estádios, o que acarretaria em receitas atraentes ao clube. Ocorre, entretanto, que o estádio foi construído em Itaquera, região com um outro perfil sócio-econômico. Numa região como esta, repleta de torcedores corinthianos e que são potenciais “clientes” do clube, um estádio traria retorno financeiro se tivesse sido planejado para não excluir esse seu “cliente” em detrimento do torcedor mais abastado.  Para isso, o exemplo do Borussia Dortmund nos é importante.

O BORUSSIA DORTMUND COMO EXEMPLO
O Borussia Dortmund, assim como o Schalke 04, são clubes alemães, como o Corinthians, de origem e apelo popular. Mas vamos nos concentrar no Borussia. O clube da região da Renânia tem um estádio para 80 mil pessoas e, como todos os clubes alemães, tem taxa de ocupação praticamente de 100%. Na maior parte do estádio  é mais barato ver o Borussia jogar do que era ver o Corinthians no Pacaembu. E o Borussia fatura muito com o seu estádio. Como cabem 80 mil pessoas, isso permite ao clube ter uma política de ingressos variada. Há muitos ingressos populares, mas há também, ainda que numa proporção menor, ingressos bem caros. E a ideia é simples, mas como toda boa ideia simples, é inteligente. Os Vips pagam caro não só para verem o time em campo. Eles pagam caro para poderem assistir  ao espetáculo que a Muralha Amarela, a torcida popular do clube, proporciona. O espetáculo é até subsidiado pela diretoria. Trata-se de uma inteligente via de mão dupla. O Corinthians – como nos informa o vice presidente Luis Paulo Rosenberg ( ver em https://www.youtube.com/watch?v=Xv2IqKSrCpY )– não quer isso. Pretende ter no seu estádio um clima mais, digamos, “clean”, sem a torcida popular. Pretende mais um clima de teatro do que de estádio e isso tudo em um estádio situado em Itaquera.
Entendo, assim, que o estádio partiu de uma concepção equivocada. Será que existiria uma alternativa? A Arena Corinthians é um estádio médio, de pouco mais de 40 mil lugares. Popularizar os preços dos ingressos não iria ao encontro do seu projeto arquitetônico e talvez não traria também as receitas desejadas, em função da pouca capacidade. Ainda assim, será melhor uma adequação dos preços, visando a ocupação total, com a compatibilização entre oferta e procura, mesmo que baixando a expectativa da diretoria de receitas muito altas. Mas a alternativa que me pareceria melhor,  seria a adequação da capacidade do estádio com o perfil de público da região em que está situado., o que significa ter  como perspectiva futura a ampliação do estádio. Mas aqui temos um outro problema. Em palestra, antes da sua inauguração , o arquiteto Aníbal Coutinho, responsável pela obra, disse que o estádio está preparado para uma eventual ampliação mas, não seria nada próximo do que ocorreu para a Copa do Mundo, com a ampliação de 20 mil lugares, 10 mil no setor sul e mais 10 mil no setor norte. Parece que o consenso é que houve descaracterização do projeto arquitetônico com esta ampliação. Deduz-se, assim, que uma eventual ampliação, respeitando as características arquitetônicas, seria, digamos, algo não maior do que 10 mil lugares, divididos entre os setores norte e sul. Ou seja, não seria o suficiente para uma alteração drástica da política de ingressos: de elitizados, ou seja, ingressos caros com carga menor, para mais populares, ou seja, uma política de obter receitas pela quantidade maior de ingressos, através de preços mais baratos.
Dessa forma, me parece que a solução seria um meio termo: não perder a perspectiva de aumentar, ainda que apenas com 10 mil lugares, não desconfigurando o projeto arquitetônico, aumentando um pouco os setores populares e permitindo uma, ainda que não a ideal, flexibilização da política de ingresso. Enquanto isso não é feito, me parece fundamental a adequação dos preços, tendo como equação, um estádio com todos os setores ocupados. O estádio está aí, com uma concepção que eu sempre achei equivocada, mas nem por isso deve-se deixar de uma busca pelas melhores soluções. Com um bom planejamento, não vai dar para chegar no Borussia, mas, ao menos, pode-se ampliar a capacidade de arrecadação mas sem perder de vista, uma compatibilização com a torcida corinthiana e a sua tradição de gerar emoção e espetáculo. 

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